terça-feira, 25 de outubro de 2011

Rio-Mar, Mar-Rio

Hoje me senti irresistivelmente impelida a escrever em meio à tantas coisas por fazer. Talvez por ter ouvido muitas histórias hoje que envolvem um elemento que sempre me causou fascinação: a água.Sempre gostei de olhar os movimentos líquidos, a água sempre me proporcionou estranha sensação de que dela sou parte (e porquê dizer que não?). Para mim a água tem uma simbologia muito especial: sinônimo de limpeza, purificação. Durante a história a água é associada a rituais de purificação e santidade, além de ser um dos quatro elementos vitais para o se humano.
Quando me sinto angustiada, carregada demais de sentimentos ruins, gosto de olhar as ondas. Aqui onde estou, sou presenteada pelos movimentos do maior rio do mundo, o Amazonas. E como filha ribeirinha, só me acalmo totalmente depois da visão espetacular do meu amado rio. E quando, depois da chuva colossal do mês de dezembro, o arco-íris surge imponente sobre o Amazonas? Ao vê-lo, sempre penso: aqui é meu lugar !
A alguns meses atrás, eu não conhecia o fantástico ser chamado MAR. E hoje senti uma falta imensa dele, da sensação que assanha meus sentidos ao ver as águas espumantes de sal. Quando tive a oportunidade de estar mais perto dele, não tive dúvidas: eu quero ver! quero sentir!. Soltei da mão que me detia e corri para as furiosas ondas. O mar me acolheu como uma mãe que acolhe um filho. Fechei os olhos e me entreguei às inúmeras sensações que me enchiam. Ouvia o farfalhar das ondas, sentia as pusilânimes batidas do meu coração, minhas veias carregadas do rio amazônida pulsavam em reconhecimento de seu pai e irmão. Meu semblante tupi que carrega o sofrimento do caboclo nortista se enrijeceu diante daquele imperioso ser quando senti as lágrimas encherem meus olhos. Meu coração gritou sua declaração de amor: eis-me aqui.
Abri os olhos e aquela visão esverdeante me entonteceu. Baixei a cabeça e vi que, na pressa, eu tinha cometido a imprudência de mergulhar os pés calçados com sandálias. Recolhi-as e senti o furioso líquido correr entre meus dedos. Olhei para trás e me reconheci no sorriso dos que me acompanhavam. Vem, vamos caminhar! disseram-me.
Pisei na areia macia e fria devido o tempo nublado e enregelante que cobria a cidade naquele dia. O mar continuou seus movimentos de vai-e-vem, como se imitasse o ato sexual. Único. Deslumbrante. O filho que eu ainda não sabia existir no meu ventre deve ter reconhecido a beleza daquele momento.
Todavia, ainda sinto a impetuosa lassidão daquelas águas incansáveis na sua vontade de engolfar a terra. Ainda sinto os membros que me acolhiam quando eu ia de encontro às ondas. Ainda sinto o beijo que sente o gosto salgado da minha pele, arranhando-se em contato comigo. Ainda sinto as mãos que me puxam, dizendo: Vem!
Quando me fiz parte do mar, senti como se vivesse uma vida que não fosse minha, uma felicidade à qual eu não tinha direito, pois dela fui arrancada com furiosa impaciência: Não, você não faz parte disso!. Em meio à lágrimas e saudades, abandonei o mar. Paixão. Saudade. Verdadeira entrega.
Voltei para meu pai, irmão e filho do mar, meu amado Amazonas, tão belo quanto aquele. Às vezes meu rio me molha quando não quero, ao contrário do mar, mas a veracidade dos sentimentos não dá pra negar. Meu filho é filho do rio que nasce dentro de mim e invade aqueles que também de mim fazem parte. O mar não tinha um nome restrito, ele era todos em um. O Amazonas é um em todos. As águas que me acolhem não são as mesmas. O mar tem a salinidade da fúria, o rio tem a doçura das asas dos pássaros. O amor permanece.
E chega o tempo das acácias que murcham sob minhas mãos.
Sim.